NO LIMINAR

CAÍA A TARDE. DO INFELIZ A PORTA,
ONDE MOFINO ARBUSTO APRECIA,
DE TRONCO SECO E DE FOLHAGEM MORTA,

ELE QUE ENTRAVA E ELA QUE SAÍA
UM INSTANTE PARARAM; UM INSTANTE
ELA ESCUTOU O QUE ELE DIZIA;

-"QUE FIZESTE? TEU GESTO INSINUANTE
QUE LHE ENSINOU? QUE FÉ LHE ENTROU NO
PEITO
AO MAGO SOM DA TUA VOZ AMANTE?

"QUANDO LHE IA AO TEMPORAL DESFEITO,
DE QUE RAIO DE SOL O MANTIVESTE?
E DE QUE FLORES LHE FORRASTE O LEITO?"

ELA, VOLVENDO O OLHAR BRANDO E CELESTE,
DISSE:"-VARRE-LHE A ALMA DESOLADA,
QUEM NEM UM RAMO, UMA SÓ FLOR LHE RESTE!

"TORNA-LHE, EM VEZ DA PAZ ABENÇOADA,
UMA VIDA DE DOR E MISÉRIA,
UMA MORTE CONTÍNUA E ANGUSTIADA.

"ESSA É A TUA MISSÃO TORVA E FUNÉREA.
EU PROCUREI NO LAR DO INFORTUNADO
DOS MEUS OLHOS VERTE-LHE A LUZ ETÉREA.

"BUSQUEI FAZER-LHE UM LEITO SEMEADO
DE ROSAS FESTIVAIS, ONDE TIVESSE
UM SONO SEM TORTURA NEM CUIDADO."

"E POR QUE O CÉU MAIS SE LHE ENEGRECE,
TIVESSE ALGUM REFLEXO DE VENTURA
ONDE O CANSADO OLHAR ESPAIRECE,

"UMA RÉSTIA DE LUZ SUAVE E PURA,
FIZ-LHE DESCER À ERMA FANTASIA,
DE MEL UNGI-LHE O CÁLIX DA AMARGURA,

"FOI TUDO EM VÃO, FOI TUDO VÃ PORFIA,
A AVENTURA NÃO VEIO.A TUA HORA
CHEGA A HORA QUE TERMINA O DIA...

MACHADO DE ASSIS